8. Bases confiáveis, não voláteis e persistentes, e a teoria sistêmica de Niklas Luhmann
Resumindo e complementando o tópico anterior, que é bastante extenso, para colocá-lo sob fundamentos sistêmicos luhmannianos, podem-se destacar, em relação às bases confiáveis externas, não voláteis e persistentes, os aspectos adiante. Adota-se o linguajar do jussociólogo alemão e, por isso, entendeu-se relevante apartar esse enquadramento teórico do item anterior.
A confiabilidade da base aliviará o sistema processual e seus operadores de muito esforço de validação da informação[31] de que necessitam[32]. A confiabilidade pode aludir apenas à qualidade da informação e à sua fidedignidade. Bases apenas confiáveis são muito úteis, mas exigem a internalização física da informação. O sistema não pode adotar apenas o fenômeno sistêmico do acoplamento estrutural[33]. O linkamento e outros mecanismos de troca/incorporação de informação poderão ser acionados para trazer aos autos virtuais a informação. Em outro momento, adotou-se o termo extraoperabilidade[34] para descrever essa internalização efetiva (não virtual) e realçar a conexão do sistema processual com os demais sistemas do mundo. Nesse caso, o sistema processual pode “alimentar-se” e manter a clausura de operação[35]. Há um trânsito efetivo do dado a processar (o sistema apropria-se dele, duplica-o, tornando um atributo sistêmico) mas não de estruturas operativas, no linguajar luhmanniano. A extraoperabilidade supõe, portanto, uma operação única.
A não volatilidade e a persistência, por seu lado, dizem respeito à conservação do dado ou informação em sua fonte externa – um requisito indispensável para o sistema processual internalizá-los apenas virtualmente. Tem a ver com história, registro (ou “log” dos técnicos) e envolve a possibilidade de reconstituição operativo-estrutural (autopoiese). Na virtualidade, é possível espancar-se o tempo e pensar em ordem, sequência de instantâneos concomitantemente presentes[36]. Como, segundo Luhmann, não existe propriamente o presente – é o ponto cego do tempo[37] -, é como se tudo, do passado, acontecesse simultaneamente. A ordem é apenas um atributo do fato, dado pelo observador. Assim, num ambiente virtual com bases confiáveis, não voláteis e persistentes, pode-se trabalhar a classificação dos fatos, sem o tempo, para separar tudo apenas em “o que é” e “o que não é”. Tudo o que já foi, é e está à disposição. Valendo-se de bases apenas confiáveis, sem os requisitos da não volatilidade e da persistência, ao contrário, o sistema processual deve internalizar efetivamente dado/informação para atribuir as qualidades da não volatilidade e da persistência. Nesse caso, o dado/informação torna-se propriedade (atributo) do objeto processual (o processo) e fixa-se no ambiente deste, destituindo-se das características intrínsecas temporais. Há uma internalização real e não virtual.
A não volatilidade e a persistência, se existentes no nível estrutural-operativo de uma base confiável externa, permitem pensar-se até mesmo na interpenetração[38]. O fechamento operacional expõe-se também à virtualidade. As fronteiras do sistema virtualizam-se nos dois âmbitos – da informação e da operação - e mobilizam-se para envolver os dados/informações, onde estão, com submissão a operações estruturais de sistemas externos mantenedores dessas bases. Não se evita apenas o fenômeno de internalização, de replicação, do dado ou da informação no interior do sistema processual. As fronteiras sistêmicas ampliam-se para além do dado e da informação, virtualmente, para abranger também a incorporação das estruturas operacionais alienígenas em sua própria malha estrutural-operativa (interpenetração). Há um alívio sistêmico no plano operacional também.
Portanto, não somente a informação é envolvida. Operações externas também podem integrar-se para ajudar a compor a estrutura operacional do sistema processual, daí a interpenetração. A clausura de operação concretiza-se, a partir dessa possibilidade, pela seleção da operação a ser integrada na estrutura operativa do sistema processual, não mais por ser o sistema processual o único detentor do espectro de possibilidades operacionais.