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Processo
eletrônico no novo CPC: é preciso virtualizar o virtual. Elementos para uma teoria geral do processo
eletrônico.
S. Tavares Pereira[1]
Resumo
Este artigo está escrito para juristas. Não para tecnólogos. O
novo CPC vai nascer velho ou vai abrir-se para a realidade de um novo
processo? Antever minimamente o futuro é
o que um legislador deve fazer. O futuro aponta para um processo sem papel, mas
não meramente digital. O novo CPC deve incorporar essa noção e
lançar as bases para o novo processo: o processo virtual. Sem macular os
princípios jurídicos processuais e materiais, o processo virtual deve ser acionado para concretizar, da maneira mais efetiva
possível, as garantias e direitos individuais. As diretrizes do novo CPC devem
contemplar a virtualidade nos
sistemas processuais, perseguir a padronização sistêmica, promover a integração
do sistema processual com o mundo (extraoperabilidade),
fomentar a geração de bases confiáveis de informação, balizar o acionamento da
publicidade no processo virtual, determinar a prevalência do jurídico sobre o
tecnológico (dupla instrumentalidade ou sub-instrumentalidade da tecnologia),
determinar a datificação
(alimentação) pertinente do sistema processual, fomentar a geração de editor de peça processual virtual e garantir a propriedade do
sistema processual ao Estado brasileiro, proibindo sua produção sob qualquer
modalidade de licença elaborada por terceiros.
Palavras-chave
Processo virtual. Virtualização. Digitalização. Extraoperabilidade. Base confiável. Editor de peça processual virtual.
Sumário
Introdução
“ [...] la perfección no es um estado
intrínseco de aspiración del sistema. Por el contrario, la perfección es una
disposición improbable [...] “.[2]
Este artigo
está escrito para juristas[3]. Não para tecnólogos.
Jurídico-sociologicamente, baseia-se na teoria sistêmica de Niklas Luhmann[4].
Tecnologicamente, baliza-se pelas últimas tendências das engenharias de
sistemas e de software. Sua história[5]
teve início no final de 2010, provocada pelas discussões sobre o tamanho das
peças processuais digitais.
Não há, aqui, um ataque a tudo que já se fez, no Brasil,
para impulsionar o uso da tecnologia no processo. Interpretações nesse sentido,
se possíveis, dever-se-ão à inabilidade do autor para expor claramente as
ideias. Os pioneiros da informatização das salas de audiência serão sempre
credores de respeito e admiração. A lei 11.419/2006 foi, é e será um marco
nessa história. Ela deu o empuxo irresistível para quebrar a inércia e pôr em
movimento inquestionável o barco do processo eletrônico. Corresponde à
“primeira lei de Newton” da física processual. A disposição dos gestores
judiciais para tornar realidade as determinações legais é inegável. Isso tudo é patente.
O que há, aqui, é uma tentativa de demonstração de que se
chegou ao ponto de colocar o barco em nova rota. Nesse ponto de emergência, as bases mesmas de
pensamento devem transformar-se: trata-se da passagem do processo regido pelas
leis da digitalização para um
processo novo, baseado nas leis da virtualização.
O CPC vai nascer velho ou vai abrir-se para a realidade de
um processo eletrônico inovador, baseado na virtualização?
Antever minimamente o futuro é o que um legislador deve fazer. Olhar ao redor e
enxergar as realidades para as quais legisla é indispensável. O processo
eletrônico do futuro – que se quer seja o processo único num horizonte de
poucos anos - deve basear-se em características daquilo que se denomina mundo
virtual, um espaço novo, com traços próprios.
O novo CPC deveria incorporar essa noção.
Vive-se, ainda, o processo tradicional (papel) e,
parcialmente, o processo eletrônico digital, desenhado pela lei
11.419/2006. O novo CPC deveria abrir
caminho para um novo processo, re-concebido segundo as possibilidades da virtualização.
Esse passo adiante pode ser dado sem macular princípios jurídicos, processuais
ou materiais[6].
Para Robert Alexy, princípios são comandos de otimização. A virtualização
do processo, posta como princípio
técnico-estratégico norteador da evolução do sistema processual, permitirá a
realização otimizada dos princípios jurídicos processuais e materiais. A busca
da concretização otimizada do princípio da duração razoável do processo é um
bom exemplo para justificar o avanço para um processo eletrônico baseado na virtualização e não apenas na digitalização.
Por que a virtualização é o caminho único para acelerar o
sistema processual? É o que se pretende demonstrar neste artigo, entre outras
coisas.
Após esta breve
introdução, estabelecem-se conceitos operacionais de digitalização e virtualização
(item 1). O item 2 reforça, com Foerster, a visão wieneriana da existência do
não automatizável. A lei 11.419/2006, com sua visão digital, é analisada no item 3.
Segue-se uma demonstração de que virtualizar
é introduzir inteligência no sistema (item 4) e evidenciam-se as limitações do
atual sistema processual – o digital.
Uma demonstração do desmonte de uma peça processual, o primeiro passo para
avançar para sua virtualização, é feita no item 5. A demonstração da
necessidade e importância da adoção de um editor de peças virtuais (item 6) é
seguida de dois itens que introduzem o conceito de bases confiáveis, não
voláteis e persistentes, como condição para a virtualização em níveis adequados
(itens 7 e 8). Nas considerações finais, são esboçadas sugestões para o
legislador do novo CPC, para que estabeleça as bases do novo processo – o processo do novo CPC.
1. Virtualização e digitalização: as categorias e os conceitos operacionais que norteiam esta exposição
1.1. Necessidade de conceitos operacionais
Embora sejam fenômenos distintos, não há oposição entre virtualizar e digitalizar. Não se trata de
termos que designem operações mutuamente exclusivas.

A digitalização,
portanto, é um mero fenômeno de representação pelo qual se transporta algo de
um meio físico não eletrônico – uma mídia como o papel – para outro,
eletrônico, lançando mão da simbologia (codificação) e da forma de registro
adequadas. A digitalização é condição
de existência da informação num meio eletrônico. Por isso o processo eletrônico não pode ser
feito sem digitalização e por isso a
lei 11.419/2006 obrigatoriamente passa pelo fenômeno.
A virtualização,
na acepção com que é tomada neste artigo, situa-se um passo adiante, como será
amplamente explicado. Ela exprime o uso da informação digitalizada.
Como se vê, carece-se de conceito para essa categoria.
Sem resvalar para discussões estéreis, que infelizmente o
termo virtual[7]
enseja fecundamente, deve-se construir uma noção que, ao menos, funcione como
um quase-conceito operacional
suficiente para a exposição do pensamento.
1.2. Gazzaniga, o cérebro e a virtualidade
Em obra de 2011, um expoente da neurociência mundial,
Michael Gazzaniga, traz uma síntese intrigante dos últimos avanços em torno do
entendimento do sistema cerebral humano. Fortemente baseado em experimentos
científicos das últimas décadas, Gazzaniga fornece elementos relevantes para a
construção da noção de virtual necessária neste trabalho.
A acepção de virtual
que se busca incorpora as noções mencionadas pelo neurocientista quando fala do
“intérprete”, um módulo processual da rede cerebral, situado no hemisfério
esquerdo do cérebro, que recebe as informações de inumeráveis módulos cerebrais
especializados, dedicados e que atuam em paralelo e independentemente. O
intérprete recebe essas informações e as consolida numa “história” que faz sentido para a consciência.

Mais adiante,
continua:
Assim, este processo interpretativo que nós temos no cérebro esquerdo pega todas as entradas, junta-as numa história que faça sentido e a põe prá fora. Como vimos, entretanto, as saídas do hemisfério esquerdo são boas apenas em consonância com a qualidade das informações que recebe. [9]
Depois, no mesmo capítulo, encontram-se as seguintes
informações adicionais muito relevantes:
O intérprete recebe os resultados da computação de uma multiplicidade de módulos. Ele não recebe a informação de que existe uma multiplicidade de módulos. Ele não recebe a informação de como os módulos trabalham. [...] O intérprete é um módulo que explica eventos pelas informações que ele efetivamente recebe. [...] Assim, talvez, para o nosso processo de interpretação, a realidade é virtual. Depende dos indícios sensoriais que estão aqui e agora.[10] [sem grifo no original]
Nos trechos transcritos está a essência da conotação de virtual aplicada neste trabalho,
conforme se explica melhor nos próximos itens.
Um analista de sistemas enxerga imediatamente, na descrição
de Gazzaniga, a vetusta concepção
sistêmica “entrada-processamento-saída” dos sistemas abertos (Bertalanffy), o
que não é impreciso. Mas a análise deve aprofundar-se[11].
Chame-se a atenção para:
a) a ideia de “processo” amplamente distribuído e especializado,
em rede;
b) a “inteligência” e a “consciência”[12]
do “processo”, que sabe com o que está trabalhando;
c) a profunda dependência do “processo” em relação à informação
que recebe;
d) o sentido teleológico do “processo”, ou seja, a produção para
um destinatário, o que supõe a já mencionada ciência (conhecimento ou
consciência) do que chega e também das expectativas em relação à saída;
e) o desmonte do todo em elementos (inputs), ou a construção de um todo
(outputs) partindo de
elementos (montagem a partir dos inputs),
via um “processo” que incorpora um padrão, um montador; a seleção
simplificadora para o ganho em complexidade[13] e
f) uma visão de algo (resultado) que, naquela forma, não existe
(ilusão? virtual?): “uma história que faça sentido para a consciência”.
Tudo isso está consolidado na ideia de virtual aqui adotada.
1.3. O significado de virtual em outras fontes
Buscando-se a definição de virtual em outras fontes, é possível encontrar significações, entre
muitas outras aqui não mencionadas, que incorporam, de alguma maneira, as noções relevantes realçadas nas transcrições
de Gazzaniga:
1) “Realidade virtual, simulação de um ambiente real por
meio de imagens...”, onde se encontra a ideia de simulação que, por sua vez, incorpora uma ação, o ato de simular, e um processo escondido, não aparente, que
trabalha entradas e gera um resultado.[14]
2) “Que é feito ou simulado através de
meios electrónicos”, onde
retornam as ideias de fazer e simular e acrescenta-se o meio eletrônico.[15]
3) No Aurélio, encontra-se o seguinte: ”Inform. Que resulta de, ou constitui uma emulação, por
programas de computador, de determinado objeto físico ou equipamento, de um
dispositivo ou recurso, ou de certos efeitos ou comportamentos seus.”[16] Simulação
transforma-se em emulação, um troca de palavras importante pois simulação tem
uma carga pejorativa associada.
1.4. Tentativa de síntese
Pode-se dizer, então,
que virtual é o que parece ser e
de fato é, mas de outra forma. A forma, tanto das entradas quanto das saídas,
deve ser distinguida do conteúdo, que é organizado finalisticamente da maneira
esperada pela consciência ( numa história que faça sentido para a consciência).
Essa criação da história é determinada pelos conteúdos (a
organização é diretamente orientada pelos conteúdos, pelas entradas). Não há
criação de entradas e sim o tratamento fiel delas para gerar um todo coerente
para o destinatário, num processo que caracteriza a virtualização. O que o destinatário vê é virtual porque ele não vê
as entradas na “forma” em que chegaram ao processo. O destinatário vê o
resultado, as entradas já organizadas/tratadas pelo processo virtualizador.
A criação da “história” pelo intérprete (processo ou algoritmo “virtualizador”) supõe amplo conhecimento dos conteúdos (a
organização baseia-se nos significados do input
para o destinatário) e também do
resultado (uma história que faça sentido para o destinatário). O intérprete conhece os elementos com que
trabalha, nas duas pontas: entradas e saídas. Essa é a ideia fundamental do
processo de virtualização. Se não
houvesse esse duplo conhecimento, não se poderia chegar à organização da história coerente segundo as
expectativas da consciência.
A ideia de virtual,
portanto, traz essa noção de “parece mas não é”, porque, de fato, é de outro
jeito, um jeito “inadequado” para o destinatário. Pensando em petição
processual, por exemplo, vê-se-a como se deseja que ela seja, mas, de fato, ela
é diferente na forma. Há uma mágica (processo) no caminho que permite ver o que
não é daquela forma. O “processo mágico” tem domínio pleno do que efetivamente
é, conteúdo este que é representado com fidelidade, sob outra forma. O segredo
e o poder estão na “mágica” da transformação (no processo interpretativo), que
sabe como é e como deve ser ou aparecer.

Quando um arquivo digital de uma imagem de um extrato
bancário é mostrado para o juiz, num monitor, há um pouco dessa mágica. Mas
apenas o absolutamente necessário. Para o computador e seu programa, a imagem é
apenas um amontoado de bits (zeros e
uns na memória).
O programa utilizado limita-se a desfazer o caminho da digitalização, num processo que poderia
ser chamado de desdigitalização ou de
virtualização primária.
Reconstitui-se a imagem do documento original num monitor. Retorna-se ao ponto
em que o olho humano possa entrar em
ação. E só.
A virtualização envolve
o humano, numa ponta do processo, como o destinatário. Enquanto a digitalização
é feita para a máquina, a virtualização
é feita para o homem. Há uma inversão de sentido do processo. A virtualização é
menos física e mais perceptiva, um fenômeno de consciência que só se concretiza,
utilitária e finalmente, no humano ou com o humano. Sem o elemento humano como
destinatário, não faz sentido falar de virtualidade. Mas pode haver digitalização. Para os conceitos
operacionais aqui terçados, os níveis de inteligência envolvidos na digitalização costumam ser primários,
quando comparados com os níveis de inteligência que podem estar envolvidos em
processos de virtualização.
Isso porque a
virtualização pode transcender a simples operação de saída do nível de digitalização – operação de desdigitalização - avançando para o que ocorre além do olho, já
no âmbito cerebral. Naquele nível elementar de que se falou acima (virtualização primária), ela é feita
para dar ao olho o acesso a informações que estejam em formato incompatível com
suas possibilidades sensoriais. A virtualização,
entretanto, pode ir muito além, absorvendo processos de que o cérebro se ocupa
após receber a informação visual. Advogados, juízes, assistentes estão
sobrecarregados com operações que o sistema processual pode executar com mais
rapidez, segurança e confiabilidade. Pode-se aliviar, tirar a sobrecarga, do intérprete.

O processo, no âmbito
cerebral, é claramente constrangido pelas entradas e pelo contexto. Ou seja, as
entradas, naquele contexto, deflagram um processo específico.
Vê-se que, falar de virtualização envolve falar de
“processo”, de inteligência, de conhecimento, de consciência. O sistema eletrônico
de processamento de ação judicial – SEPAJ - precisa dar esse passo adiante e
absorver, após o processo de virtualização primária, outros processos de
virtualização que, na atualidade, ocorrem apenas nos cérebros de advogados,
procuradores, assistentes e juízes. É preciso ir além do “ 3 + 8” e mostrar, logo, o 11. A viabilização desse “passo adiante” supõe
algumas coisas. A primeira delas é a própria digitalização da informação em
formato compatível para o uso posterior por processos automáticos (datificação pertinente)[17]. Algumas outras são abordadas adiante, neste
artigo. E isso pode ser feito gradualmente, desde que se ponha o
desenvolvimento e a evolução dos SEPAJs sob o norte da virtualização.
2. O juiz e a virtualização: máquinas triviais e não triviais
A Lei 11.419/2006 trouxe o processo digital. O CPC deveria
avançar para o processo virtual. A virtualização significa o alívio para os
operadores jurídicos, entre os quais se encontra o magistrado. Esse alívio suporia a eliminação do juiz do
processo? O objetivo seria alcançar um processo sem juiz, conforme o sonho
acalentado pela informática jurídica na década de 70?
A resposta categórica é não[18]. Norbert Wiener já reconhecera isso na
década de 50.
Heinz Von Foerster, na obra Observing Systems[19],
mencionada por Niklas Luhmann, diferencia máquinas triviais e não triviais.
Nessa denominação, máquina é tomada “ [...] en sentido cibernético. Se trata de
fórmulas matemáticas, cálculos, reglas
de transformación y no forzosamente de un artefacto eletrônico o mecânico.”[20] Máquina é um algoritmo.
Nas máquinas triviais,
um conjunto de inputs gera, sempre,
os outputs correspondentes. O estado
interior e momentâneo da máquina só muito raramente interfere nesse caminho de
transformação (em geral, por defeito). E
os eventuais desvios podem ser rapidamente detectados pelos especialistas.
Uma máquina não
trivial caracteriza-se pela impossibilidade de se saber, com certeza, os outputs que determinados inputs vão gerar. O estado momentâneo da
máquina interfere diretamente na produção dos outputs esperados. Pode haver até a não produção. “Las máquinas no triviales tienen, así, integrado un circuito por el cual se
refieren a si mismas (autorreferencia)”[21].
Pode-se tomar como axioma que o Direito é um sistema
autopoiético[22]. O
mesmo pode ser dito do subsistema processual, funcionalmente diferenciado para
os fins de aplicação da lei. São sistemas de sentido, ou sociais, no linguajar
luhmanniano, equiparáveis a máquinas não triviais. Não são sistemas técnicos, como é o caso da
ferramenta processual chamada sistema eletrônico de processamento de ação
judicial (SEPAJ).
Como ferramenta tecnológica para tramitar a ação, o SEPAJ
pode ser equiparado ao que Foerster chamou de máquina trivial. Assim, um SEPAJ, como máquina trivial, programada,
é completamente previsível. Na verdade, representa um conjunto de funções de
determinadas variáveis.
No processo, os humanos (advogados, assistentes, juízes,
testemunhas, peritos, partes) são os responsáveis pela introdução da não trivialidade. A cargo deles se
encontra a avaliação autorreferencial, ou seja, em momentos muito
especiais, a eles incumbe fazer a
medição das condições internas efetivas para fazer o próximo giro do
sistema. Também lhes incumbe a inovação
das regras de transformação. Por isso que, quando se fala em máxima automação dos sistemas de
processamento de ação, não se está cogitando da eliminação do juiz, como já
realçado.
É preciso entender, no entanto, que, no curso do processo, e
até o momento anterior às decisões (seja de quem for, inclusive do advogado
quando decide a estratégia a adotar), há uma imensidão de operações triviais das quais, hoje, incumbem-se
esses mesmos operadores. Elas podem ser entregues à execução otimizada por
programas/módulos (máquinas triviais)
incorporados ao SEPAJ. Para isso, os algoritmos devem receber as condições para
simular o que poderia ser chamado de pseudo-autorreferência,
via metadados. Na verdade, introduzem-se
as condições para que o sistema “conheça” os inputs e possa promover laços operacionais característicos da
automação que, embora limitados e circunscritos a aspectos parciais, aliviam
sobremaneira os operadores.
Quanto mais o SEPAJ absorver as operações triviais
(automatizar-se), mais eficiente se tornará no auxílio aos operadores que têm o
ônus de promover os giros não triviais.
A virtualização está nesse caminho. A máquina trivial, representada pelo sistema
processual, pode ser ampliada, em suas funções, para ajudar com operações que
se situam depois do contato visual e que, hoje, sobrecarregam os cérebros dos
operadores.
3. A lei 11.419,
a ênfase
para a digitalização e o esmaecimento da virtualização
3.1. Muita digitalização. Zero de virtualização.
A lei 11.419/2006 – a lei do processo eletrônico – não
contém o termo virtual.
Ela apresenta, entretanto: 9 ocorrências da palavra digital/ais; 5 da palavra digitalização; 3 da palavra digitalmente,
5 da palavra digitalizados/as e 1 da
palavra digitalizando, num total de 22 ocorrências de palavra
com raiz “digital”.
As palavras apresentam-se espalhadas ao longo do texto, em
diferentes dispositivos – artigos, parágrafos etc. Encontram-se na lei:
“arquivos digitais”, “assinatura digital”, “certificado digital”, “assinado
digitalmente”, “digitalizando-se o documento físico”, “equipamentos de
digitalização”, “documentos digitalizados e juntados”, “processo de
digitalização”, “documentos cuja digitalização seja tecnicamente inviável”,
“digitalização de autos”, “mídia não digital”, “digitalmente”, “armazenados de
modo integralmente digital em arquivo eletrônico” e “cópia digital de título
executivo”.
Numa lei de 20 artigos, isso dá uma média superior a um
aparecimento por artigo. Ou seja, o
Brasil dispõe de um processo eletrônico fundado na digitalização, como não poderia deixar de ser. O que se está propondo é um avanço para um
processo eletrônico que incorpore, de maneira robusta, a virtualização, porque
esta é condição necessária, indispensável, para acelerar o processo decisório,
exatamente o calcanhar-de-aquiles do processo eletrônico atual.
A ênfase legal para o fenômeno da digitalização escamoteou a importância de se ir além e de se prestigiar
a introdução, no sistema processual, das possibilidades que somente a virtualização pode trazer. Na verdade, conscientemente ou
inconscientemente, fez-se um movimento de fuga da complexidade, o que
compromete inteiramente o futuro do processo eletrônico. Como diz Niklas Luhmann,
Desde el
punto de vista formal el concepto de complejidad se define, entonces, mediante
los términos de elemento y relación. El problema de la
complejidad queda, así, caracterizado como aumento cuantitativo de los
elementos: al aumentar el número de elementos que deben permanecer unidos en el
sistema, aumenta en proporción geométrica el número de las posibles relaciones,
y esto conduce, entonces, a que el sistema se vea obligado a seleccionar la
manera en que debe relacionar dichos elementos.”[23]
Parece fato inquestionável, hoje, que a mera digitalização das peças e demais elementos dos autos
processuais – como tem ocorrido no Brasil -
não é condição suficiente para se alcançar um processo eletrônico com as
características necessárias para colocar a tecnologia de forma otimizada a
serviço de uma melhor prestação jurisdicional, qualitativa e quantitativamente
falando. É condição necessária, mas não
suficiente. Muita esperança tem sido posta no processo eletrônico marcado
apenas pela digitalização. Entretanto, tais expectativas somente serão
atendidas pelo próximo processo, o processo virtual.
3.2. O parágrafo único desafiador
Há um dispositivo na lei 11.419/2006, na verdade um comando
expresso, que tem sido esquecido pela maioria dos SEPAJs atuais. A
impossibilidade de dar cumprimento a esse comando legal é, talvez, a expressão
mais contundente da impotência do processo eletrônico digital existente no
Brasil hoje. Nessa norma, o legislador
determinou que se fizesse o que é impossível fazer num processo desenhado e
desenvolvido segundo os ditames da mesma lei. Mais parece um titubeio
legislativo. Ou um devaneio.
Esse comando da lei 11.419/2006 só será atendido se o novo
CPC der o passo avante. No âmbito de um novo processo, que permitirá o desenho
de um sistema processual com as características expostas neste artigo, o
legislador de 2006 será finalmente atendido.
Não se trata apenas de atender àquela determinação. O que o
caso evidencia é que, num processo com nova concepção, abrir-se-ão caminhos
para que o sistema processual efetivamente incorpore os meios de tirar a
sobrecarga atual de trabalho dos operadores.
Diz o parágrafo único do artigo 14 da lei 11.419/2006: “Os
sistemas devem buscar identificar os casos de ocorrência de prevenção,
litispendência e coisa julgada.”
Qual sistema eletrônico de processamento de ação judicial,
hoje, está apto a “buscar identificar” a ocorrência dos fenômenos jurídicos
indicados? O atendimento a esse comando
legal supõe um imenso conhecimento do sistema a respeito de vários elementos
dos autos processuais. E, pior, de distintos autos processuais. A disciplina
legal em torno desses institutos demonstra a riqueza de informação necessária
para se articular um algoritmo que possa, ao menos, sugerir a possibilidade de
ocorrência de uma das situações processuais aventadas. “Ah, pode-se ao menos informar que os dois
processos têm as mesmas partes.” Será? Talvez até nesse nível elementar
(partes) pode ser duvidoso, para alguns sistemas, expedir uma afirmação.
E não se diga que não se avançou porque há a necessidade de
todos os processos estarem sob a forma eletrônica. Da maneira como estão sendo
concebidos os SEPAJs, jamais será possível atender a esse comando legislativo.
Pense-se, por exemplo, apenas nos detalhes para caracterização da coisa
julgada.
4. O sistema processual eletrônico atual, suas peças digitais e suas limitações. Revisando e exemplificando.
No título do artigo, fala-se em virtualizar o virtual. Na verdade, poder-se-ia, no
máximo, dizer virtualizar o digital.
A provocação do título serve para realçar a diferença entre as duas ideias e
marcar bem a distinção entre elas, às vezes utilizadas como sinônimas.
4.1. Papel, bits, bytes e informação
Se dígito é tomado com o sentido de bit (a menor quantidade de informação que um computador trata),
então digitalizar tem o sentido de representar em bits.
Embora o computador trabalhe com bits (é comum dizer-se que tudo é zeros e uns na memória do
computador), pode-se dizer que é apenas num patamar mais elevado, de
agrupamento de bits (os bytes), que os conteúdos começam a fazer
algum sentido para os computadores e para os humanos. A letra A, por exemplo, é
um conjunto organizado de bits e, em
geral, ocupa um byte (oito bits) na
memória. Entre o registro na memória e o que se vê na tela, entra um programa
de computador que transforma os bits
do byte num conjunto maior de bits
que, representados no monitor, representam uma figura que os humanos conseguem
“ler” (recuperar visualmente). Essa
“mágica” transformadora – que sabe,
pela quantidade e disposição dos bits
nos bytes (inputs), como transformá-los em um outro conjunto de bits que, exposto numa tela, torna-o um
símbolo legível por humanos (forma conveniente para o destinatário) - é a
essência a realçar do processo de virtualização.
Vê-se o que, de fato, é de outra forma.
É preciso levar essa mágica para um outro patamar no âmbito
do processo eletrônico[24].
Ampliar essa mágica é implantar inteligência no sistema processual para que o
sistema não apenas transforme bits em
bytes, mas aprenda a lidar com
conjuntos de bytes e possa,
manipulando-os, auxiliar os humanos de uma forma mais efetiva.
A digitalização,
já se viu, é um processo de representação feito num sentido. Por exemplo: do
papel (imagem visual) para o disco magnético (registro físico-tecnológico). A
virtualização também é um processo de representação, pode-se dizer, mas feito
no sentido oposto. A digitalização vai no sentido dos bits, a virtualização, como aqui proposta, é um fenômeno que parte
dos bits e, de maneira inteligente,
chega a modelos de representação e a processos de tratamento da informação
acessíveis e confortáveis para os humanos. O destinatário é o homem, a máquina não trivial do processo (Foerster).
4.2. As peças monolíticas dos autos em papel continuam nos autos eletrônicos. E toda a lógica do sistema processual orienta-se por elas.
Nos sistemas processuais eletrônicos brasileiros atuais,
apesar de ter sido mudada a mídia – do papel para o disco rígido –, continua-se
a trabalhar com peças (falando-se só delas, mas isso vale para o todo!) que não
são virtuais. São peças digitais, mas
não virtuais[25].
O suporte físico agora não é mais o papel. É um disco magnético. O registro da peça processual, que no papel
se fazia com letras e possibilitava a leitura direta pelos sentidos (olho
humano), passou a ser feito com bits,
cada um representando um minúsculo ponto de uma imagem, espacialmente
localizado num plano. Dali, do disco rígido, somente um programa de computador
pode remontar as “letras” para que o humano analise a informação registrada. Ou
seja, toda recuperação de informação é necessariamente mediada[26].
Ocorre, no caso, uma desdigitalização.
O legislador distinguiu documento eletrônico de documento digitalizado
(artigo 11 da lei 11.419/2006, por exemplo). No documento eletrônico, que
também é digital, eleva-se um pouco o nível de conhecimento a respeito do que
está digitalizado. Há programas que permitem, em arquivos nesse formato, mexer
nas letras, mudar a forma, enfim, “editar”. Chega-se ao nível dos bytes ou dos caracteres.
Entretanto, as peças monolíticas, duras, permanentes,
inteiras, continuam nos autos. Mesmo num
arquivo em formato “.pdf”, apesar da imposição de um formato de
codificação, trabalha-se com a “imagem do
documento”, não com seus conteúdos. Aliás, o formato foi adotado principalmente
para evitar a alteração dos conteúdos.
-Quero ver a petição
inicial, o despacho tal, a sentença, o acórdão!
Sem problemas. Vai-se ao sistema, o arquivo digital é desdigitalizado e ganha forma, num
monitor, para leitura pelo humano curioso. Ou é baixado para ulterior
impressão.
Tudo se transforma, entretanto, se o curioso pretender ir um
pouquinho além da virtualização primária:
-Quero ver a fundamentação do terceiro pedido! Ou a cláusula
2ª da CCT de 2010!
Claro, poder-se-á
ver. Mas para isso deverá ser buscada a petição ou o texto da CCT. E, a partir
daí, olho (até quando os olhos vão agüentar?) e setinhas levarão o interessado
a extrair a informação da imagem exibida. Às vezes, depois de um bom incômodo.
Os milhões despendidos em sistemas processuais, até agora, não nos levaram a
esse patamar elementar de atendimento às curiosidades dos interessados:
advogados, juízes, assistentes.
Isso porque as peças são produzidas e juntadas como algo
insosso, sólido e indecifrável pelo programa processual. No máximo, os
programas conseguem recompor os pontos ou bits,
num monitor ou numa impressora, para refazer a imagem das letras no papel.
Sabe-se, também, que, num arquivo ‘escaneado”, se o registro da imagem das
letras é confiável, é possível recuperar as letras e gerar um arquivo editável
(documento eletrônico). É o processo de reconhecimento ótico de caracteres
(OCR), também conhecido como digitalização
do conteúdo literal da imagem.
Em relação a todas essas imagens presentes nos autos
processuais eletrônicos atuais, o máximo que o sistema processual “sabe” é que
existe um arquivo digital, que deve ser aberto e exibido por determinado
software capaz de ler cada ponto da imagem e exibir num monitor. Qualquer
conteúdo informacional contido naquela imagem continua a ser extraído pelo
usuário, visualmente, não mais a partir do papel (embora sejam muitos os que
ainda imprimam antes de usar), mas a partir da imagem exposta num monitor. As coisas não mudam muito quando se fala de
um documento eletrônico, produzido por um editor de texto do mercado.
Vai-se do bit ao
olho do advogado, do assistente ou do juiz.
4.3. O juiz e o gerente: a fraqueza e o poder.
Tome-se o exemplo das imagens “escaneadas” e juntadas aos
autos. Podem ser as imagens de envelopes de pagamento de um processo
trabalhista. Quando o advogado baixa as
imagens (ou o juiz as examina no monitor), não está lidando com arquivos virtuais. Trata-se, na verdade, de
arquivos digitais.
A situação é completamente diferente na empresa onde está o
sistema que gerou aqueles envelopes. O gerente pode pedir ao sistema, de uma
forma muito simples (comando SQL, por exemplo), que liste os envelopes do
empregado tal, dos meses em que houve o pagamento de horas extraordinárias além
de 40. E que apresente um total. Depois ele pode pedir que mostre o envelope do
mês em que houve maior excesso de horas. E o sistema exibe o envelope no
monitor. Ele monta, na hora, este envelope. No linguajar de Gazzaniga, os
elementos da entrada (dados que estão nos discos do sistema de folha de
pagamento) são montados segundo o formato que o destinatário espera.
O que faz o juiz quando quer saber isso num processo?
Das três, uma: chama o assistente, envia os autos para o
contador ou, então, usa olhos, caneta, calculadora e produz a informação! Com
bravura...
Volte-se ao advogado que foi até o sistema processual,
zanzou prá lá e prá cá, escolheu uma imagem de um envelope de pagamento e
baixou.
Esqueça-se o arquivo baixado e pense-se nas páginas do
sistema processual pelas quais o advogado transitou. Essas sim são virtuais.
Elas não existem. Como o envelope de pagamento do gerente, elas são montadas
para o usuário, na hora em que são buscadas. Provavelmente, um minuto depois, o
navegador as montará diferentes, para o mesmo usuário ou para os outros milhões
que, naquele momento, estão acessando o site.
Um navegador é exatamente isso. Um programa que “monta uma
imagem de página” toda vez que é demandada. E a exibe no monitor. Se houver o
acesso de um milhão de pessoas, simultaneamente, um milhão de vezes a página
será “montada”, virtualmente (aquele processo inteligente que atua a partir das
entradas, conhecendo-as, e preocupado com o que espera o destinatário momentâneo),
para exibição nas telas dos usuários. A página é aquele ser existente por meio
das tecnologias da informação e da comunicação. E que “é montada” (ocorre a
mágica), não apenas exibida.
4.4. Virtualizar é introduzir inteligência no sistema processual
O que está por trás
dessa transitoriedade de existência das páginas, dessa montagem para exibição,
pode parecer trivial, mas não é. Ela supõe muito mais que o mero exibir de
“pontos numa tela de monitor”, como já se viu nos tópicos anteriores. Ela exige um nível superior, mais refinado,
de conhecimento do sistema a respeito daquilo que ele está manipulando. A imagem exibida não é apenas a projeção de
um conjunto simples, ponto a ponto, univocamente, de bits existentes num disco rígido, num monitor (caso típico da
exibição de uma imagem digital). Numa construção virtual,
o sistema, segundo sua estrutura operacional (seus algoritmos), “monta a
história”, considerando os conteúdos a serem exibidos, os mecanismos de
tratamento, a formatação a que devem ser submetidos etc. Para os fins deste
trabalho, lembre-se, algo que distingue digital
de virtual é a introdução de algum
nível adicional de conhecimento sistêmico (consciência) a respeito dos
conteúdos representados pelos bits e bytes de um arquivo digital, antes da
exibição ao usuário. Alguns chamariam esse conhecimento de meta-informação.

Se a ideia é levada às peças processuais, percebe-se logo
que a questão do tamanho se esboroa. Não
haverá peças processuais. Elas serão montadas no momento da construção, ou da
consulta, com o tamanho que precisarem ter, de maneira inteligente e com o
nível desejado (e programado) de “ciência” a respeito dos conteúdos.
As peças poderão ter “visões” adequadas e convenientes para
quem as está acessando: juiz, advogado, partes (foco no destinatário, o que não
significa que um não possa ver a visão do outro!). Ver-se-á o que se desejar ver, no momento em
que precisar ver, e, inclusive e se for o caso, nos limites do que for
permitido ver (questão da publicidade!).
Por isso, é preciso virtualizar o digital. É necessário que
o novo CPC preveja, expressamente, a possibilidade da virtualização das peças
processuais e do processo como um todo (autos virtuais). Estar-se-á dando,
assim, um passo fundamental para se avançar com o processo virtual para
patamares em que a tecnologia será utilizada de maneira nobre e eficaz para
auxiliar os operadores jurídicos: advogados, procuradores, assistentes e,
claro, notadamente o juiz, no momento de
decidir.
5. Tamanho de uma peça processual: função de muitas variáveis
Originalmente, este artigo partia da questão do tamanho das
peças processuais para refletir sobre a virtualização. Fazia uma análise das
razões pelas quais as peças processuais têm se tornado cada vez maiores,
passava pelas variáveis que se articulavam para gerar esse aumento de tamanho
e, ao final, desembocava num desmonte analítico-cartesiano de uma peça-tipo
para exibir os elementos sobre os quais a tecnologia poderia trabalhar, desde
que se adotasse a virtualização. Esse exercício continua válido.
Lembre-se, seguindo na direção apontada pelo
neurofisiologista Gazzaniga, que a “história” montada para a consciência parte
de elementos de entrada. O processo
transformador (intérprete) conhece esses elementos e as expectativas do
destinatário (consciência) e gera uma saída que faça sentido para ele.
5.1. Variáveis e elementos de uma petição inicial
Faz-se, nos próximos subitens deste item 4, um exercício
rápido, mas útil, para se pensar na virtualização de uma peça processual
específica: a petição inicial. A partir dele, é possível pensar em espancar as
peças digitais monolíticas do processo, substituindo-as por peças virtuais,
inteligentes.
Tome-se uma petição inicial ideal, elaborada com um editor
de texto comum. Considerá-la contextualmente e desmontá-la lógico-cartesianamente
demonstra que: a) uma imensidão de
variáveis está em jogo e contribui para
um tamanho maior e b) a tecnologia pode ajudar, atuando sobre muitas dessas
variáveis, para, entre outras coisas, “reduzir o tamanho”.
Algumas variáveis interessam para a virtualização. Outras
não. Veja-se: o estilo pessoal do redator, a facilidade do famoso copia-cola
trazido pelo computador, a facilidade de remendar a peça até o último momento
(quem lembra do tempo do carbono? Os recém-formados, ao ouvirem carbono, pensam
no efeito estufa! Os antigos ainda lembram do efeito “apaga em cascata, folha a
folha!”), a facilidade de acesso e consulta à doutrina e à jurisprudência, a qualidade do cliente e suas exigências, o “faturamento”
(puxa, você cobrou isso para escrever uma folhinha?), a quantidade de pedidos,
a quantidade de teses a serem expostas ou analisadas na peça, a quantidade de
partes e testemunhas, a qualidade da tese – pacificada ou inovadora – o nível
em que a peça está chegando ao processo, e por aí vai.
Num esforço de organização, que nem de longe pretende ser
exaustivo ou adequado, é possível
agrupá-las em ao menos 5 categorias:
a) Subjetivas;
b) Objetivo-contextuais;
c) Tecnológicas;
d) De conteúdo e
e) Estruturais-textuais.
5.2. Variáveis subjetivas
Envolvem qualidades pessoais do redator.
Exemplificativamente: (i) estilo, (ii) facilidade para expor objetivamente
fatos e direito, (iii) nível de conhecimento da língua e dos direitos material
e processual e (iv) familiaridade com os novos recursos tecnológicos. A
tecnologia só mediatamente pode ajudar no aperfeiçoamento dessas variáveis.
Programas sérios e bem montados para a difusão intensa da
cultura tecnológica – que ensinem a tecnologia, desmistifiquem, desmontem medos
e “provem” as vantagens de sua utilização – precisam ser parte integrante do
esforço de evolução para o processo virtual.
5.3. Variáveis objetivo-contextuais
Não estão ligadas aos redatores, mas ao seu entorno: (i)
exigências do cliente, cada vez mais esclarecido e informado; (ii) necessidade de “produzir para faturar”; (iii)
a obrigação de “cumprir metas” e, apesar de tudo, manter a qualidade e as
possibilidades processuais (não é só no âmbito judicial que as metas têm sido
estabelecidas); (iv) os desencontros judiciais a respeito das teses jurídicas;
(v) os mecanismos de orientação
constitucional somente agora estabelecidos com maior rigor; (vi) a mobilidade constitucional, uma
característica do neoconstitucionalismo calcado em princípios tomados como
pautas sempre abertas; (vii) as exigências legal-formais para as diferentes
peças processuais; (viii) os rigores em
relação à análise da forma, levando todos a pensar em errar pela abundância e
(ix) os novos direitos, que chegam em gerações (Bobbio) e desafiam a capacidade
de trato das questões e de julgamento em tempo razoável.
Esses são alguns exemplos de como o mundo circundante se
reflete (projeta-se e condiciona) no trabalho do produtor da peça jurídica.
Todas essas variáveis tornam mais
complexa a operação do direito e obrigam os agentes a utilizar a tecnologia, da
forma mais eficaz possível, para superar os desafios. Num mundo de crescente
complexidade, a tecnologia pode e deve ser acionada, de forma criativa, para
otimizar as condições de trato dessa complexidade.
Em vários dos exemplos, a virtualização poderá postar-se ao
lado do produtor da peça para o auxiliar: melhoria da qualidade sem perda de
produtividade, atendimento facilitado das formas etc.
5.4. Variáveis tecnológicas
Ditas tecnológicas porque oriundas da chegada e da
incorporação, na vida do direito e do processo,
das tecnologias da informação e da comunicação.
Pode-se destacar: (i) as facilidades trazidas pela
tecnologia, no sentido da busca de informação doutrinal e jurisprudencial; (ii)
as facilidades de edição de texto, com o famoso copia-cola, encontram-se entre
as campeãs da proliferação das peças longas; (iii) as facilidades para incluir
coisas nos textos já prontos, que permite responder à inarredável tendência
para “aperfeiçoar” a peça (é humano e generalizado!); (iv) o acesso aos
mais variados argumentos encontráveis na
internet para acrescentar ao discurso; (v) os mecanismos de busca, as listas de
discussão e o amadurecimento das soluções a muitas mãos e cabeças e (vi) as redes sociais.
A tecnologia abriu caminhos para a geração do caos em termos
de peça processual. Viu-se, acima, que há muita coisa trabalhando na direção da
maior quantidade dos litígios. Nos processos daí oriundos, há uma vastíssima
cesta de razões, de todas as origens, para
pedir e para contestar.
Nada é demais. Nem suficiente. Sempre cabe mais um
argumento. À mão ou à máquina de escrever, ficar-se-ia nas primeiras páginas,
após um esforço seletivo do que pudesse constituir o melhor argumento. Com
internet, mecanismos de busca, decisões à vontade para consultar, conhecer e
prever possíveis caminhos do processo (juízes, composições de turma etc), a
abundância jamais é alcançada. Não há ponto de saturação.
Somente com
tecnologia bem usada, com ampla “virtualização” do processo (com ênfase
para as peças), pode-se responder a essa exacerbação das possibilidades do jogo
processual promovida pela tecnologia.
Tecnologia contra tecnologia.
5.5. Variáveis de conteúdo
Parece axiomático que a complexificação da vida social
ampliou, de forma exponencial, a possibilidade de litígios. Não houve apenas um
crescimento do número de litígios. Os litígios se qualificaram. Também eles
ganharam complexidade. Quantidade de partes, testemunhas, pedidos,
preliminares, prejudiciais. Causas de pedir,
razões de defesa.
As dificuldades de acesso à justiça matavam no nascedouro um
torvelinho de demandas. Os novos procedimentos amplificaram o acesso. Trouxeram
a facilidade para demandar. A afirmação das minorias e o reconhecimento de
inumeráveis direitos, quase sempre ensejadores de grande controvérsia no âmbito
moral, vieram contribuir para tornar mais amplas, complexas e extensas as
demandas e seus fundamentos.
A tecnologia está na base desse incremento. Usá-la
criativamente para responder a esse incremento é um dever.
5.6. Variáveis estrutural-textuais
Este é o grupo mais sensível
e responsivo à virtualização. A
virtualização funda-se, em boa medida, no tratamento de algumas dessas
variáveis. Os elementos
estrutural-textuais podem ser:
a) textos fático-expositivos;
b) textos argumentativo-doutrinários;
c) textos argumentativo-jurisprudenciais (ementas, trechos de
acórdãos);
d) textos auto-argumentativos e
e) textos extrínseco-formais.
As possibilidades de reuso desses textos são evidentes. E o
conhecimento dos elementos pelo
sistema processual abre inumeráveis caminhos para a evolução do apoio sistêmico
aos operadores.
A exposição dos fatos deverá ser feita pelo redator. Num
primeiro momento, parece não haver espaço, neste ponto, para reuso de textos.
Isso não é exato. Há milhões de ações percorrendo os canais judiciais onde os
fatos são exatamente os mesmos. O mesmo raciocínio aplica-se para os textos
auto-argumentativos, embora de forma mais restrita. O Sepaj deve, também, saber
a relação desses fatos com os demais elementos da peça.
A utilização de suporte doutrinário, que ocupa boa parte das
peças processuais, pode e deve submeter-se às possibilidades da virtualização
efetiva do processo.
Os apoios jurisprudenciais poluem, permita-se a expressão, a
imensa maioria das peças processuais. Um
mesmo texto – uma ementa ou trecho de acórdão – replica-se aos milhões pelas
peças. Após o primeiro contato – quando o texto perde a condição de
acontecimento informacional – tais textos passam a ser meros ocupantes de
espaços em discos e em monitores.
Finalmente, há os textos extrínseco-formais. Eles se
espalham aos milhões, nos processos, dos despachos às sentenças. Um alvará não
precisa ter vida monolítico-digital, precisa ter vida virtual. Um mandado de
busca e apreensão de certo bem vale-se de uma descrição que também deve ser a
adotada no leilão e na carta de adjudicação e na decisão que julgar eventuais
embargos. Numa petição inicial, que foi
escolhida para essa análise, os textos extrínseco-formais se estendem do
vocativo ao requerimento. Os próprios pedidos podem e devem ser enquadrados
nessa categoria. Eles são elementos fundamentais da “história montada” e o
sistema deve ter firme e bem definido conhecimento desses elementos e suas
relações nos autos. Eles serão o grande fio condutor da construção
sistêmico-estrutural autopoiética[27].
Enfim, há imenso espaço, aqui, para se utilizar a tecnologia
e caminhar, de forma consistente, para a virtualização efetiva das peças
processuais. Pode ser exuberante o resultado do desmonte virtual das peças, com
a introdução de visões próprias, segundo o interessado na leitura. Os chamados
“hiperlinks” podem ser acionados de uma maneira eficaz, no âmbito do sistema
processual, para permitir que o usuário, em vez de ler a peça, navegue na peça.
É possível criar “visões da peça”, com ou sem jurisprudência, com ou sem
doutrina, só auto-argumentos, só fatos, tudo sobre o pedido “x”, enfim, o que
se desejar.
6. Manejando as variáveis de uma peça processual: o editor de peça processual virtual
No esboço do artigo original, lançaram-se as seguintes
ideias: “- A edição como parte fundamental do processo virtual; - Da ‘edição de
texto’ – genérica - para a ‘edição de
peça processual’ – específica e - O editor como parte integrante do sistema do
processo eletrônico, especializado e simples.” Essas ideias merecem as
explicações que se seguem.
Tendo-se em conta a proposta de virtualização efetiva das
peças processuais – e do processo como um todo – torna-se evidente que a produção
dessas peças pode e deve ser efetuada por editores próprios, preparados para a
geração de tal documento virtual, não meramente digital. A edição
especializada passa a ser, sem dúvida, parte indispensável de um sistema
processual.
Daí falar-se em avançar da ideia de edição de texto para a
edição de peça processual.
O PJe-JT, recentemente implantado na vara do trabalho da
cidade de Navegantes, em
Santa Catarina , já incorpora um editor de textos para a
produção das peças processuais no âmbito do próprio sistema. Esse editor ainda
trabalha muito próximo da noção de uma edição de texto comum. Mas ele abre a
porta para evoluir e chegar à concepção de edição especializada de peça
processual. Os tecnólogos, entendendo a essência da atividade processual,
poderão avançar essa ferramenta para torná-la um facilitador do trabalho dos
operadores jurídicos na produção de efetivas peças virtuais.
Ao contrário do que se pode pensar à primeira vista, isso
não significa apenas empacotar ou
formatar a peça, um termo que, pela carga de restrição que porta, cria uma
imensa e imediata resistência dos operadores. Ao contrário, um editor de peça
virtual vai garantir ao advogado, com grande liberdade e simplicidade, manter a
aparência da edição comum, com a produção efetiva de uma peça virtual apta a
permitir que o sistema processual deixe de ser um mero estoquista de imagens
para postar-se como efetivo auxiliar dos operadores. Sob a aparência da
continuidade, promove-se consistente mudança.
A ideia da formatação das peças via empacotamento – que
todos lerão, pensa-se, como “encaixotar as coisas da peça” – tende a manter as
considerações na superficialidade e, sob a promessa de uma imposição de ordem e
local para colocar as coisas, oferece quase nada em troca.
◙ As tecnologias estão prontas para que se
possam concretizar as ideias deste trabalho. É necessário, apenas, que o
legislador determine que se faça. E que os juristas parem de resistir. Dos recursos de comunicação às técnicas de
desenvolvimento de sistemas, tudo está disponível.
|
O editor de peças processuais virtuais, se bem concebido,
além de manter o elo com a cultura visual e de trabalho existente, não será
visto como um engessador, mas como um apoiador da geração da peça. Presume-se ser muito melhor trabalhar com
um editor especializado do que com um genérico.
Combinado com um trabalho especializado de engenharia do
conhecimento e de software, o editor de peças processuais virtuais
transformar-se-á numa imensa janela pela qual o sistema processual evoluirá em
inteligência e poderá assumir papeis de apoio a todos os operadores jurídicos,
notadamente juízes e advogados. Neste
artigo, porque voltado aos juristas, deixou-se de mencionar os meios
tecnológicos e suas potencialidades. Eles estão disponíveis, muito evoluídos,
nos dois âmbitos – hardware e software – com possibilidades plenas de tornar
realidade as ideias aqui ventiladas.
7. Bases confiáveis: não volatilidade e persistência.
A existência de bases confiáveis, não voláteis e
persistentes, acessáveis por linkamento e
outras tecnologias, é um corolário da
virtualização. O exame dos elementos das peças processuais demonstra isso. E a
pretensão de virtualizar o processo em termos mais amplos reforça essa
necessidade. O legislador deve
contemplá-las para autorizar sua formação e seu uso.
A virtualização das peças processuais (que permitirá
caminhar para a virtualização máxima dos autos, como um todo) e a adoção de
tecnologias como a do linkamento, não significam, como pensam alguns, escancarar o processo ao mundo,
destruir suas fronteiras, tirar do sistema processual aquilo que faz dele um
sistema: os limites, que ele mesmo controla, do que é processo e do que não é
processo, do que está no âmbito processual e do que está no entorno do
processo. A ferramenta sistêmica, o SEPAJ, em sua concepção, deve estar a
serviço do processo e intimamente vinculada a ele, às suas necessidades e à sua
preservação.
Sistema é diferença entre ele mesmo e o ambiente[28].
A complexidade fica fora. O que é
internalizado, entra no sistema segundo suas regras e para o âmbito de suas
operações (acoplamento estrutural - informação). Se externo, há de ser estável, no sentido de,
em laços de verificação posteriores, alcançar-se a reprodução da operação nos
moldes efetuados ao tempo em que o ato processual seletivo e determinante da
operação subseqüente ocorreu (autopoiese).
Portanto, ao falar-se em hipertexto, não se deve pensar na
abertura do processo para o mundo externo, incontroladamente e sem memória. O
presente do processo deve ser compatível com cada “presente” vivido no passado
dele. A possibilidade de reconstituição do caminho feito pelos participantes,
no âmbito do processo, até certo momento, deve ser condição da validade
processual. Rápido parênteses: para os que
lembrarem, neste ponto, do processo oral, é importante informar que, no
caso, trabalha-se com o suposto do compartilhamento dos fundamentos e com a
persistência do decidido, daí dizer-se que a oralidade é condicionada pela
imediatidade. Sem imediação não é
possível o processo oral e, no caso, abre-se expressamente mão da
“reconstituição de caminhos” – enlaçamento estrutural - nos moldes mencionados
acima. Fecha parênteses.
Retomando a questão de fundo, portanto, vê-se a necessidade
de se falar em bases confiáveis. Base
confiável de informação, não volátil e persistente, é aquela fonte que,
virtualmente, apenas virtualmente, passará a fazer parte do processo. Os
requisitos da não volatilidade e da persistência parecem ser evidentes, uma vez
que se quer que os conteúdos dessas bases de dados, na exata forma em que
entraram na consideração dos agentes processuais e instrumentalizaram operações
no caminho processual – determinaram a evolução estrutural-autopoiética do
processo -, se perpetuem no tempo e na forma.
A ideia de não volatilidade acentua a necessidade de imutabilidade da
informação. Ao juntar-se a ideia de persistência, realça-se o aspecto temporal.
O instantâneo (a fotografia) tomado da base de dados para
promover, internamente, a operação processual e o respectivo acoplamento
estrutural, deve manter-se intacto, exatamente como se tivesse sido
internalizado em termos “reais”, como se tivesse sido juntado aos autos do
processo virtual.
Todo conjunto de informação, acessável via hiperlink, por exemplo, com os requisitos da não volatilidade e da
persistência, pode ser tomado como base confiável para fins de incorporação
virtual. Os meios de certificação dessa confiabilidade devem ser estabelecidos.
É importante – muito importante mesmo – registrar que os
requisitos da persistência e não volatilidade não significam “imobilidade”.
Numa base de entendimentos doutrinários, por exemplo, os geradores de
informação terão plenas condições de se
movimentarem, em seus entendimentos a respeito de qualquer matéria. Bastará
criar o novo entendimento, registrar na base e, daí em diante, adotar esse novo
entendimento. A persistência tem a ver
com a possibilidade de, a qualquer tempo, poder-se “reconstituir” o momento
processual em que a informação entrou (orientou o acoplamento estrutural),
exatamente na forma em que foi levada em consideração. Ou
seja, tudo que foi produzido com base numa situação ultrapassada de
entendimento, deve poder ser reconstituído com aquela situação. A “montagem” de uma sentença, por exemplo,
deve ser possível no futuro, exatamente como foi montada na ocasião de sua
prolação.
Inúmeras dessas bases confiáveis já existem. Outras podem
ser rapidamente transformadas nelas.
Todas as bases jurisprudenciais, os diários eletrônicos, as bases legislativas,
os bancos de dados de convenções coletivas, dados de cartórios eletrônicos,
bases da previdência social, bases bancárias, da receita federal, e assim por
diante. Inúmeras delas são estabelecidas, legalmente, como não voláteis e
persistentes. Os próprios autos
processuais mantidos pelos tribunais são, ou podem ser, bases confiáveis.
Além das bases confiáveis institucionais, poder-se-ia pensar
em bases confiáveis privadas, desde que estabelecidos os parâmetros para seu
estabelecimento. Os arquivos de fonte de dados (AFDs) dos pontos eletrônicos,
por exemplo, poderiam ser depositados em bases especiais, privadamente
mantidas, para acesso pelos sistemas processuais. Enfim, os limites dessa ideia
são difíceis de estabelecer.
O próprio sistema processual pode ir constituindo suas bases
confiáveis, as quais não serão necessariamente internas. No âmbito dele, podem
ser criados espaços privados para alimentação pelos usuários[29],
para seu exclusivo uso. Certa categoria de conteúdo, uma vez entregue, podem tornar-se
inalterável e ser acessada exclusivamente no sentido baseàprocesso.
Em esquema semelhante, os magistrados podem transplantar
para o sistema processual suas bases de informação, exatamente como costumam
fazer nos seus esquemas normais de trabalho.
É possível, inclusive, estabelecer bases em rede, para o compartilhamento da base de
conhecimento entre os magistrados. Naturalmente, no caso, com as restrições de
segurança que forem julgadas adequadas, inclusive para criar a disposição de
compartilhamento junto à magistratura.
Mecanismos de pesquisa bem estabelecidos podem acessar tais
bases confiáveis, utilizando com plenitude o princípio da ubiqüidade. A ideia de instantaneidade deve ser, no caso,
interpretada como “imediatidade” – o ausente torna-se presente com a mediação
tecnológica – e como instantâneo, momentâneo, fixado no tempo para perpetuar-se
na “foto do momento”.
A confiabilidade de bases não voláteis e persistentes alivia
o processo da necessidade de internalizar fisicamente a informação. O âmbito do
processo, virtualmente construído, espraia-se pelos limites do “utilizado”, o
que garante a autonomia processual apesar da virtualidade da internalização do
dado. A persistência permite que se
considere a alimentação virtual como válida para considerar os trechos de
informação de outras bases como integrantes da própria base do sistema
processual.
O requisito sistêmico da autoreferenciabilidade fica
atendido pela virtualidade dos lindes. Uma visão inteiramente pertinente para
um efetivo processo virtual.
E, finalmente, tem-se de considerar que a internalização
virtual da informação dar-se-á segundo as regras do sistema processual –
autonomia sistêmica[30]
-, com as garantias da ampla defesa e do contraditório. Tais requisitos, do
devido processo legal, serão condições a serem garantidas pelo próprio sistema
processual.
8. Bases confiáveis, não voláteis e persistentes, e a teoria sistêmica de Niklas Luhmann
Resumindo e complementando o tópico anterior, que é bastante
extenso, para colocá-lo sob fundamentos
sistêmicos luhmannianos, podem-se destacar, em relação às bases
confiáveis externas, não voláteis e
persistentes, os aspectos adiante. Adota-se o linguajar do jussociólogo alemão
e, por isso, entendeu-se relevante apartar esse enquadramento teórico do item
anterior.
A confiabilidade
da base aliviará o sistema processual e seus operadores de muito esforço de
validação da informação[31]
de que necessitam[32]. A confiabilidade pode aludir apenas à
qualidade da informação e à sua fidedignidade. Bases apenas confiáveis são muito úteis, mas
exigem a internalização física da
informação. O sistema não pode adotar apenas o fenômeno sistêmico do acoplamento estrutural[33].
O linkamento e outros mecanismos de
troca/incorporação de informação poderão ser acionados para trazer aos autos
virtuais a informação. Em outro momento,
adotou-se o termo extraoperabilidade[34]
para descrever essa internalização efetiva (não virtual) e realçar a conexão do sistema processual com os demais
sistemas do mundo. Nesse caso, o sistema
processual pode “alimentar-se” e manter a clausura
de operação[35].
Há um trânsito efetivo do dado a processar (o sistema apropria-se dele,
duplica-o, tornando um atributo sistêmico) mas não de estruturas operativas, no
linguajar luhmanniano. A extraoperabilidade supõe, portanto, uma
operação única.
A não volatilidade e
a persistência, por seu lado, dizem respeito à conservação do dado ou
informação em sua fonte externa – um requisito indispensável para o sistema
processual internalizá-los apenas virtualmente.
Tem a ver com história, registro (ou “log” dos técnicos) e envolve a
possibilidade de reconstituição operativo-estrutural (autopoiese). Na
virtualidade, é possível espancar-se o tempo e pensar em ordem, sequência de
instantâneos concomitantemente presentes[36]. Como, segundo Luhmann, não existe propriamente o presente – é o
ponto cego do tempo[37] -, é como se tudo, do passado, acontecesse simultaneamente. A ordem é apenas
um atributo do fato, dado pelo observador.
Assim, num ambiente virtual com bases
confiáveis, não voláteis e persistentes, pode-se trabalhar a classificação dos fatos, sem o tempo, para
separar tudo apenas em “o que é” e “o
que não é”. Tudo o que já foi, é e está à disposição. Valendo-se de bases apenas confiáveis, sem os
requisitos da não volatilidade e da persistência, ao contrário, o sistema
processual deve internalizar
efetivamente dado/informação para atribuir as qualidades da não
volatilidade e da persistência. Nesse caso, o dado/informação torna-se
propriedade (atributo) do objeto processual (o processo) e fixa-se no ambiente
deste, destituindo-se das características intrínsecas temporais. Há uma
internalização real e não virtual.
A não volatilidade e
a persistência, se existentes no nível estrutural-operativo de uma base
confiável externa, permitem pensar-se
até mesmo na interpenetração[38]. O fechamento operacional expõe-se também à
virtualidade. As fronteiras do sistema virtualizam-se nos dois âmbitos – da
informação e da operação - e
mobilizam-se para envolver os dados/informações, onde estão, com submissão a
operações estruturais de sistemas
externos mantenedores dessas bases. Não se evita apenas o fenômeno de
internalização, de replicação, do dado
ou da informação no interior do sistema processual. As fronteiras sistêmicas
ampliam-se para além do dado e da informação, virtualmente, para abranger
também a incorporação das estruturas operacionais alienígenas em sua própria
malha estrutural-operativa (interpenetração).
Há um alívio sistêmico no plano operacional também.
Portanto, não somente a informação é envolvida. Operações
externas também podem integrar-se para ajudar a compor a estrutura operacional
do sistema processual, daí a interpenetração.
A clausura de operação concretiza-se,
a partir dessa possibilidade, pela seleção da operação a ser integrada na
estrutura operativa do sistema processual, não mais por ser o sistema
processual o único detentor do espectro de possibilidades operacionais.
Considerações finais
O novo CPC não pode nascer velho. E deve assumir o papel de
grande sistematizador do processo virtual
no Brasil. Um processo em que as máquinas farão tudo o que podem fazer melhor
que o homem. E aos homens estará reservado o trabalho que só eles podem e devem
fazer no processo, notadamente o “julgar”.
O processo digital
vem prestando imensos benefícios para o avanço tecnológico no âmbito judicial.
Suas limitações também começam a se tornar evidentes. O novo CPC, pela natural
perspectiva de futuro por trás de uma legislação dessa natureza, deve abrir os caminhos
para a implantação de um efetivo processo virtual,
conforme a acepção de virtual adotada
neste artigo: um processo novo, com forte incorporação de automação em todas as
tarefas que possam ser entregues, no linguajar de Foerster, às máquinas triviais.
O processo digital
exibirá, cada vez mais, sua incapacidade para produzir os resultados esperados
de aceleração dos prazos e de otimização da qualidade da prestação
jurisdicional. Sua concepção sistêmica aponta para esse resultado. Portanto, o
avanço para um processo virtual é uma
imposição do tempo sobre o legislador.
Se este, ao elaborar a mais relevante lei do país atinente
ao processo, passar ao largo dessa questão, negando-se a enfrentar o problema
do novo processo – que será obrigatoriamente virtual, o processo
eletrônico do novo CPC – estará cometendo, permite-se pensar, um erro histórico. A cidadania clama por uma Justiça
célere e de qualidade. Somente um processo virtual
é capaz de responder a esse reclamo constitucional do brasileiro.
Os detalhes poderão ser remetidos para legislação esparsa.
Entretanto, o grande arcabouço, as grandes diretrizes, terão de ser postas pelo
novo diploma processual. O novo CPC pode
e deve ao menos:
(i) Determinar que se caminhe na direção da virtualidade e se abandone a mera digitalização; os desdobramentos desse
comando são incontáveis, chegando até à facilitação e aceleração do ato
decisório (auxiliando efetivamente o juiz);
(ii) Estabelecer a padronização sistêmica, em níveis que só
a virtualização pode permitir – o que não significa sistemas iguais, os
técnicos sabem disso;
(iii) Exigir e autorizar a integração sistêmica plena do ou
dos SEPAJs com os demais sistemas do mundo (extraoperabilidade);
(iv) Determinar e autorizar o estabelecimento e a utilização
de bases de dados confiáveis; com isso, entre outras coisas, abrindo espaço
para o uso amplo, mas seguro e controlado, do linkamento e outras tecnologias,
nos sistemas processuais, nos níveis de informação e operação;
(v) Zelar pelo acionamento da publicidade somente até os
limites necessários para a garantia da fidedignidade do processo (evitar os
julgamentos secretos); a virtualização facilitará enormemente esse ajuste;
(vi) Determinar a submissão da tecnologia ao jurídico e não
o inverso (princípio da dupla instrumentalidade ou da subinstrumentalidade da tecnologia);
(vii) Determinar que a alimentação do sistema processual se
faça em consonância com os ditames da virtualidade
e de modo que abram caminhos para a otimização do sistema processual (datificação pertinente);
(viii) Determinar a adoção de peças processuais virtuais e abrir caminho para investimentos públicos no desenvolvimento de
ferramenta de edição especializada de peças processuais (editor de peça
processual virtual), de propriedade do Estado e de distribuição gratuita, para
uso acoplado aos sistemas processuais ou não;
a determinação deverá ser feita no nível de generalidade e abstração
compatível com o teor da lei, mas com redação que abranja o que já agora se
mostra adequado para o processo e
(ix) Determinar que o sistema processual, independentemente
das ferramentas tecnológicas adotadas, seja de propriedade do Estado brasileiro
– que dele poderá dispor da maneira que os interesses nacionais exigirem - e
não esteja sujeito a licenças de quaisquer ordens, formatadas por terceiros.
Referências bibliográficas
GAZZANIGA, Michael S. Who´s
in charge? Free Hill and the science of the brain. New
York :Harper Collins Publishers, 2011. 260p.
LUHMANN,
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(Das recht der gesellschaft). Formatação
eletrônica. Versão 5.0, de 131003. Disponível em:
http://forodelderecho.blogcindario.com/2008/04/00432-el-derecho-de-la-sociedad-niklas-luhmann.html.
Acesso em: 10 nov. 2011.
__________________.
Introducción a La teoria de sistemas. Lecciones
publicadas por Javier Torres Nafarrate. México:Universidad Iberoamericana,
1996. 304p.
__________________. Legitimação
pelo procedimento. Trad. De Maria da Conceição Côrte-Real. Brasilia:UnB, 1980. 210p.
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Sistemi sociali. Fondamenti di una
teoria generale. Tradução para o italiano de Alberto Febbrajo e Reinhard
Schmidt. Introdução à edição italiana de Alberto Febbrajo. Bologna:Società
editrice il Mulino, 1990. 761p.
__________________. Sociología
do directo II. Trad. De Gustavo Bayer. Rio de Janeiro:Edições Tempo
Brasileiro, 1985. 212p.
PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, máxima automação,
extraoperabilidade, imaginalização mínima e máximo apoio ao juiz:
ciberprocesso. Disponível em: HTTP://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/35515.
Acesso em: 3 abr. 2009.
________________. O processo eletrônico e o princípio da dupla
instrumentalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1937, 20
out. 2008. Disponível em:
<HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp¿id=11824>. Acesso em: 16 mar.
2009.
Elaboração: finalizada em 25 fev. 2012.
[1]
Sebastião Tavares Pereira é mestre em Ciência Jurídica
(Univali/SC), doutorando em Direito do Trabalho pela UBA, especialista em Direito Processual Civil
Contemporâneo pela PUC/RS, analista de sistemas e juiz do trabalho aposentado
do TRT12. Foi professor de lógica de programação, linguagem de programação,
banco de dados, direito constitucional, do trabalho e processual do trabalho,
em nível de graduação e pós-graduação.
Programa em Delphi/pascal e PHP.
[2] LUHMANN,
Niklas. Introducción a la teoría de sistemas. Lecciones publicadas por Javier
Torres Nafarrate. México:Universidad Iberoamericana, 1996. p. 135.
[3] O título
do artigo é uma provocação. Melhor seria dizer “virtualizar o digital”. Pelo porquê dado na nota de rodapé n. 5,
informa-se que o título original proposto para este artigo era: “Peça
processual no processo eletrônico: elementos para uma teoria geral do processo
eletrônico. Desmistificando a questão do tamanho das peças processuais.
Virtualizando o virtual.”
[4] O marco
teórico do autor, em termos jurídico-sociológicos, é o pensamento sistêmico de
Niklas Luhmann, assim denominado porque representa uma aplicação da visão
sistêmica em geral para o caso particular dos sistemas sociais. As linhas
teóricas do jussociólogo alemão foram tomadas, notadamente, das seguintes
obras: LUHMANN, Niklas. Introducción a la teoria de sistemas, referida em nota anterior.
LUHMANN, Niklas. El derecho de la
sociedad. (Das recht der gesellschaft). Formatação eletrônica. Versão 5.0, de 131003.
Disponível em:
http://forodelderecho.blogcindario.com/2008/04/00432-el-derecho-de-la-sociedad-niklas-luhmann.html.
Acesso em: 10 nov. 2011. LUHMANN, Niklas. Legitimação
pelo procedimento. Trad. de Maria da Conceição Corte-Real. Brasília:UnB, 1980. 210p. LUHMANN, Niklas. Sistemi sociali. Fondamenti di una
teoria generale. Tradução para o italiano de Alberto Febbrajo e Reinhard
Schmidt. Introdução à edição italiana de Alberto Febbrajo. Bologna:Società
editrice il Mulino, 1990. 761p. LUHMANN,
Niklas. Sociologia do direito II.
Trad. de Gustavo Bayer. Rio de Janeiro:Edições Tempo Brasileiro, 1985.
212p.
[5] No quarto
trimestre de 2010, exacerbou-se, na mídia e nas listas especializadas de
discussão sobre e-justiça, um debate a respeito do tamanho das peças
processuais eletrônicas. Isso induziu o início da produção deste artigo pelo
autor. Em fevereiro de 2011, alguns tópicos estavam bem desenvolvidos e outros
apenas esquematizados. O artigo foi, então, aberto para dois outros estudiosos
do processo eletrônico (um magistrado e um técnico), com a intenção de
terminá-lo a três. Apesar da tentativa
de estabelecimento de uma metodologia para colaboração a distância, o trabalho
a três não aconteceu por razões diversas. Haja vista as circunstâncias atuais
atinentes ao esforço legislativo para produção de um novo CPC, entende-se
oportuno publicá-lo com os ajustes e complementações naturais, principalmente
trazendo para primeiro plano o que, na época, estava posto como ideia de fundo:
a questão da virtualização.
[6] PEREIRA,
S. Tavares. O processo eletrônico e o princípio da dupla
instrumentalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1937, 20
out. 2008. Disponível em:
<HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp¿id=11824>. Acesso em: 16 mar.
2009. Neste artigo, o autor chama a atenção para o risco que a incorporação
tecnológica ao processo, sem os devidos cuidados, pode representar. E lança o princípio da
dupla instrumentalidade (ou da subinstrumentalidade) da tecnologia, como baliza
incontornável para a produção dos sistemas processuais eletrônicos.
[7] O termo
“virtualização” apresenta imensa ambigüidade, mesmo se se considerar apenas a
área de TI. A respeito, veja-se: Virtualização
esclarecida – oito diferentes modos. Disponível em: http://www.f5networks.com.br/pdf/white-papers/virtualizacao-esclarecida-oito-diferentes-modos-wp.pdf.
Acesso em: 10 nov. 2011. E esse paper
não esgota o assunto. Caminhando-se para outros âmbitos, como o filosófico ou o
da neurociência, a ideia ganha contornos
dramaticamente distintos.
[8] GAZZANIGA, Michael S. Who´s in charge? Free will and the science
of the brain. New York :Harper
Collins Publishers, 2011. p. 88.
[9] GAZZANIGA, Michael S. Who´s in charge…, p. 89.
[10] GAZZANIGA, Michael S. Who´s in charge…, p. 94.
[11] A
teoria dos sistemas abertos não conseguiu explicar a inversão da tendência à
entropia, característica dos sistemas fechados. O sistema psíquico-cerebral (e
o processo também) é claramente neguentrópico. Portanto, há algo mais nesse
espaço, explicado pela noção de clausura
de operação. Veja-se, a respeito, o texto muito elucidativo de Luhmann:
LUHMANN, Niklas. El derecho de la
sociedad. p. 27 e seguintes.
[12] Luhmann
não concordaria com essa analogia, pois para ele a consciência (sistema
psíquico) situa-se fora do sistema social. Adota-se, aí, no sentido de “estar ciente”.
[13] Ao tratar da questão da
complexidade, Luhmann escreve: “Elaborado de esta manera el concepto de
complejidad se vuelve, al mismo tiempo, más complejo y más realista porque
ahora están tomados en cuenta el número
de elementos, el número de posibles relaciones, el tipo de elemento y el tiempo
específico de la relacionad de estos elementos.” [sem grifo no
original ] LUHMANN, Niklas. Introducción..., p. 139.
[14]
Disponível em: http://www.dicio.com.br/virtual/.
Acesso em: 10 nov. 2011.
[15]
Disponível em: http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=virtual.
Acesso em: 10 nov. 2011.
[16]
Disponível em: http://www2.trt12.gov.br/aurelio/home.asp.
Acesso em: 10 nov. 2011.
[17] O
princípio da imaginalização mínima
realça esta ideia. A imagem caminha em sentido inverso ao aqui proposto.
PEREIRA, S. Tavares. Processo
eletrônico, máxima automação, extraoperabilidade, imaginalização mínima e
máximo apoio ao juiz: ciberprocesso. Disponível em: HTTP://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/35515.
Acesso em: 3 abr. 2009.
[18] Ao lançar o
princípio da máxima automação, o autor escreveu: “Por trás desse princípio,
estão duas noções básicas: (i) a ideia de que há - e haverá sempre -, atos processuais não
automatizáveis, conforme a previsão wieneriana. Mas o comando de otimização
para o processo eletrônico deve ser no sentido de se alcançar, um dia, as
fronteiras do ‘não automatizável’, entregando às tecnologias digitais tudo
aquilo que for passível de automação (automação máxima). Precisa-se desmontar
os ‘espaços sagrados’ e destravar a inventividade dos técnicos.” PEREIRA, S.
Tavares. Processo eletrônico, máxima
automação....
[19] FOERSTER, H. Von. Observing Systems. Seaside, Cal.
1981. Referência de Niklas Luhmann.
[20] LUHMANN, Niklas. Introducción…, p. 82.
[21] LUHMANN, Niklas. Introducción…, p. 82.
[22] Apesar das divergências teóricas a respeito,
conforme realça Niklas Luhmann: “Para
una teoría de los sistemas sociales no se puede contar con un tal
consenso, y esto sobre todo es válido para describir el sistema de derecho como
un sistema social autopoiético, clausurado en su operación.” LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. p. 31. LUHMANN, Niklas. Introducción…, p. 85: “Autopoiesis [...] significa determinación del estado
siguiente del sistema, a partir de la limitación anterior a la que llegó la
operación.”
[23]
LUHMANN, Niklas. Introducción..., p.
137. Luhmann refere-se a um sistema que
tenha de dar conta, completamente, das referidas relações. Mais adiante, na
mesma lição, p. 138, o jussociológico reporta que os sistemas avançam, em sua
concepção estrutural, para abandonar esse conceito de complexidade simples (todos os elementos ligados a todos os outros)
e adotar o conceito de complexidade complexa (em que se
estabelecem seletivamente as relações
entre os elementos), ganhando em capacidade de variação.
[24] Em
outro momento, propôs-se o princípio da máxima automação, uma forma diferente
de transmitir essa ideia hoje tão necessária ao sistema eletrônico de
processamento de ação judicial.
[25]
Pensando-se apenas na virtualização primária ou desdigitalização, as peças são virtuais.
É óbvio que não se trata de raciocinar nesse nível elementar.
[26] Nos
velhos tempos da informática, quando se registravam os caracteres em cartões
perfurados, muitos humanos – inclusive o autor – eram capazes de ler os
furinhos do cartão e saber que caracter estava registrado na coluna.
[27] “El sistema posee un campo de
estructuras delimitadas que determinan el espectro de lo posible de las
operaciones del sistema […] Las
estructuras condicionan el espectro de la posibilidad en el sistema; la
autopoiesis determina lo que es posible de facto en la actualidad de la
operación. El patrón de las estructuras precondiciona
lo que es susceptible de ser tratado; la autopoiesis determina lo que de facto ha de ser tratado.” Luhmann, Niklas. Introducción..., p. 104. Portanto, os elementos sempre estão
referidos e orientados para as estruturas.
E vice-versa. A estrutura
sistêmica deve estar preparada para
receber os pedidos – e suas relações com os demais elementos da peça –
para que a estrutura do processo específico (autopoiese) se construa com
amplificação dessas relações. Isso maximiza as possibilidades de o sistema
auxiliar os operadores.
[28] LUHMANN, Niklas. Introducción…, p. 61 e seguintes.
[29] O PJe
vai adotar ideia semelhante para resolver o problema da juntada da defesa em
audiência.
[30]
Linguajar de Luhmann na sua pragmática sistêmica, anterior à incorporação das
noções de autopoiese à teoria. LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento.
[31] Para
Luhmann, informação é o acontecimento capaz de acionar determinada estrutura
operativa. Sob tal perspectiva, um dado
pode ou não ser informação. Neste artigo, não há a preocupação de distinguir
rigorosamente dado e informação.
[32] Milhões
de citações do mesmo acórdão deveriam ser conferidas, caso a caso, para
consideração nas decisões. Transcrições de certa cláusula de convenção
coletiva, idem. A descrição do item a leiloar, que já foi utilizada num mandado
de penhora, idem. Quantas vezes o juiz
confere ”de novo” o texto que o assistente incluiu na proposta de decisão,
buscando-o na base de “assuntos resolvidos” do próprio juiz?
[33] Sobre
acoplamento estrutural, vejam-se especialmente as lições 5 e 11 de LUHMANN,
Niklas. Introducción a la teoría de sistemas.
[34]
PEREIRA, S. Tavares. Processo
eletrônico, máxima automação....
[36] O tempo
é objeto de considerações centrais na obra luhmanniana. “ [...] El tiempo es un
mero constructo del observador” e, na perspectiva deste, uma operação que se
realiza de modo concreto. Por
el hecho de iniciar una observación, el observador echa a andar el tiempo.”
LUHMANN, Niklas. Introducción…, p.
157. “Cómo operaciones, todas las observaciones de un observador son siempre
(siempre!) simultáneas […] todo lo que sucede, acontece
simultáneamente.” Introducción…, p.
158.
[37] “Presente es, así, el fragmento en
el que se empieza a hacer posible lo
pasado o lo futuro.” LUHMANN, Niklas. Introducción…,
p. 163.
[38] LUHMANN, Niklas. Introducción…, pp. 42, 191, 195,196 e
203, entre outras.